sábado, 19 de fevereiro de 2011

A predestinação

Reflexão a partir das lições 21 - A Predestinação -, e 22 - Predestinação e Reprovação -, do livro de R. C. Sproul "Verdades Essenciais da Fé Cristã", Segundo Caderno, Editora Cultura Cristã, 2006.


RESUMO
A consulta aos textos bíblicos e estudos sobre predestinação levaram-me à seguinte conclusão: o tema não deve ser abordado diante do público em geral. Para o grande público é mais urgente reforçar a doutrina-raíz do Evangelho de Cristo, segundo a síntese feita por Ele mesmo, e/ou as mensagens que a reforçam, por serem portadoras de esperança aos que sofrem e aos que têm um coração amoroso e limpo. Já os estudiosos, que eles pensem mil vezes antes de reivindicar domínio sobre o assunto, pois, ao fazê-lo, poderão estar demonstrando querer ultrapassar a sabedoria do próprio Deus. Os teólogos clássicos, pelo menos, chegaram a um consenso: o assunto não deve ser apresentado a todos, de forma indiscriminada, pois isso, além de não trazer benefícios, pode trazer grandes malefícios.


1. INTRODUÇÃO
Afirma Sproul, na página 55 do livro acima citado, relativamente à Lição 1 - A Predestinação -:

"Praticamente, todas as igrejas cristãs têm algum tipo de doutrina sobre a predestinação. (...). Muitas igrejas, entretanto, discordam - muitas vezes veementemente - quanto ao seu significado. O ponto de vista metodista é diferente do ponto de vista luterano, o qual discorda do ponto de vista presbiteriano. Embora seus pontos de vista difiram, cada um deles está tentando chegar a uma sólida compreensão desta difícil questão de maneira apropriada."

"(...): desde toda a eternidade, antes mesmo que nós existíssemos, Deus decidiu salvar alguns membros da raça humana e permitir que o resto da raça humana perecesse. Deus fez uma escolha - escolheu alguns indivíduos para serem salvos na eterna bênção do céu e escolheu passar por sobre os outros, permitindo que sofressem as consequências dos seus pecados no tormento eterno do inferno.

A aceitação dessa definição é comum a muitas igrejas. (...). O ponto de vista não-reformado, defendido pela grande maioria dos cristãos, é que Deus faz essa escolha com base em sua presciência. Deus escolhe para a vida eterna aqueles que sabe que o escolherão. (...).

A visão reformada difere no fato de que ela vê a decisão final para a salvação nas mãos de Deus, e não nas mãos do homem. Segundo este ponto de vista, a eleição de Deus é soberana. Não se baseia nas decisões ou respostas previstas por parte dos seres humanos. Aliás, vê tais decisões fluindo da graça soberana de Deus."

Na Lição 2 - Predestinação e Reprovação -, página 58, Sproul continua afirmando: (...). "A eleição refere-se apenas a um aspecto da questão mais ampla da predestinação. O outro lado da moeda é a reprovação. Deus declarou que amava Jacó mas odiava Esaú. Como podemos entender essa referência ao ódio divino?

A predestinação é dupla. A única maneira de evitar a doutrina da predestinação dupla é afirmar que Deus predestina todos para a eleição ou que não predestina ninguém seja para a eleição seja para a reprovação. Visto que a Bíblia ensina claramente a predestinação para a eleição e nega a salvação universal, temos de concluir que a predestinação é dupla: inclui tanto a eleição como reprovação. A dupla predestinação é inevitável se tomarmos a Bíblia a sério. [grifo meu]"

Após tecer considerações lógicas decorrentes dos desdobramentos da predestinação dupla, Sproul termina suas considerações na página 59, de forma sugestiva:

"(...). Vamos deixar que o leitor decida."


2. PASSAGENS BÍBLICAS A RESPEITO DO TEMA
Não há dúvida de que a Bíblia afirma a dupla predestinação. Os textos citados por Sproul, embora não exaustivos, foram selecionados por serem inquestionáveis a esse respeito.

Na Lição 21, Sproul recomenda as seguintes passagens bíblicas:
Probérbios 16.4; João 13.18; Romanos 8.30; Efésios 1.3-14; 2 Tessalonicenses 2.13-15. Ao longo do seu texto ele ainda cita: Romanos 9.10-12,16 e Romanos 9.14,15.

Na Lição 22, as seguintes passagens sãos recomendadas:
Êxodo 7.1-5, Provérbios 16.4; Romanos 9; Efésios 1.3-6; Judas 1.4.

Porém, como sabemos, há passagens que se concentram somente no lado positivo da predestinação, dando esperança a todos que se sentem atraídos pelo Evangelho de Cristo. Esses textos não serão destacados nesta reflexão para que o foco sobre o assunto seja mantido na sua dimensão mais difícil.


3. EXEMPLOS DE ESTUDOS A RESPEITO DO TEMA

3.1 - Visão Católica
Veja aqui.

3.2 - Visão Reformada Calvinista
Veja aqui.


4. POSIÇÕES DE GRANDES TEÓLOGOS

4.1 - Agostinho de Hipona
Veja aqui.

4.2 - Tomás de Aquino
Veja aqui.

4.3 - Martinho Lutero
Veja aqui.

4.4 - João Calvino
Veja aqui.


5. COMENTÁRIOS E CONCLUSÃO GERAL
Voltemos ao que Sproul afirmou na página 55, relativa à Lição 1 - A Predestinação -, que foi destacado na introdução desta reflexão:

"Praticamente, todas as igrejas cristãs têm algum tipo de doutrina sobre a predestinação. (...). Muitas igrejas, entretanto, discordam - muitas vezes veementemente - quanto ao seu significado. O ponto de vista metodista é diferente do ponto de vista luterano, o qual discorda do ponto de vista presbiteriano. Embora seus pontos de vista difiram, cada um deles está tentando chegar a uma sólida compreensão desta difícil questão de maneira apropriada."

Ressaltemos algumas opiniões sobre como lidar com o assunto, estas tiradas das referências citadas no item 4:

Agostinho de Hipona
Não identifiquei uma posição simples e concisa, exceto, talvez, sua posição implícita de que Deus faz a eleição pela presciência da escolha humana, seja para a salvação, seja para a perdição. Esse posicionamento precisa ser confirmado.

Tomás de Aquino
"(...) deve-se dizer que ainda que a própria predestinação seja revelada a alguns por um privilégio especial, entretanto, não convém seja revelada a todos; pois neste caso os não-predestinados cairiam no desespero e a segurança de ser predestinado geraria negligência." Entenda-se que, quando ele se refere a predestinados, está se referindo à eleição para a vida eterna.

Lutero
Ele deu o seguite conselho a uma pessoa que estava muito ansiosa quanto ao fato de ser eleita ou réproba:

“Quando tais pensamentos a assaltam, você deve aprender a perguntar a si mesma: “Por favor, em que mandamento está escrito que eu deva pensar sobre esse assunto e lidar com ele?”. Quando parecer que não há tal mandamento, aprenda a dizer: “Saia daqui, maldito diabo! Você está tentando fazer com que eu me preocupe comigo mesma. Meu Deus declara em todos os lugares que eu devo deixá-lo tomar conta de mim [...]”. A mais sublime de todas as ordens de Deus é esta, que mantenhamos diante de nossos olhos a imagem de seu Filho querido, nosso Senhor Jesus Cristo. Todos os dias ele deve ser nosso excelente espelho, no qual contemplamos o quanto Deus nos ama e quão bem, em sua infinita bondade, ele cuidou de nós ao dar seu Filho amado por nós. Desse modo, eu digo, e de nenhum outro, um homem aprende a lidar adequadamente com a questão da predestinação. Será evidente que você crê em Cristo. Se você crê, então será chamada. E, se é chamada, então muito certamente está predestinada. Não deixe que esse espelho e trono de graça seja quebrado diante de seus olhos [...] Contemple o Cristo dado por nós. Então, se Deus desejar, você se sentirá melhor”.


Calvino
"Em primeiro lugar, então, quando os homens quiserem fazer pesquisa sobre a predestinação, é preciso que se lembrem de entrar no santuário da sabedoria divina. Nesta questão, se a pessoa estiver cheia de si e se intrometer com excessiva autoconfiança e ousadia, jamais irá satisfazer a sua curiosidade. Entrará num labirinto da qual nunca achará saída. Porque não é certo que as coisas que Deus quis manter ocultas e das quais ele não concede pleno conhecimento sejam esquadrinhadas dessa forma pelos homens. Também não é certo sujeitar a sabedoria de Deus ao critério humano e pretender que este penetre a sua infinidade eterna. Pois ele quer que a sua altíssima sabedoria seja mais adorada que compreendida (a fim de que seja admirada pelo que é). (...)."

Meus comentários
Eu não poderia esquecer das palavras de Cristo em Mateus 11:25: "respondendo Jesus, disse: Graças te dou, ó Pai, Senhor do céu e da terra, que ocultaste estas coisas aos sábios e entendidos, e as revelaste aos pequeninos." Neste caso, parece que os pequeninos a que Ele se refere, a menos que sejam estimulados, nem fazem perguntas sobre o assunto, pois estão totalmente concentrados na prática efetiva do Evangelho.

Tendo em vista tudo o que foi dito até o momento, desisto da intenção de emitir opinião técnica sobre o assunto, embora eu tenha ensaiado uma resposta elegante para o mesmo com base na filosofia aristotélica. Evoco, para proteger-me, a doutrina expressa por Jesus Cristo em Marcos 12:30-31:

"Amarás, pois, ao Senhor teu Deus de todo o teu coração, e de toda a tua alma, e de todo o teu entendimento, e de todas as tuas forças; este é o primeiro mandamento.
E o segundo, semelhante a este, é: Amarás o teu próximo como a ti mesmo. Não há outro mandamento maior do que estes."

Aceita esta doutrina, devemos praticá-la, pois isso será bom para nós e bom exemplo para os demais. Não podemos ter a pretensão de, citando a predestinação, assustar os réprobos, pois eles já estão condenados, e, além do mais, nós não sabemos quais são eles. Por outro lado, de nada adianta ressaltar esta doutrina para alegrar os eleitos, pois, igualmente, eles já são eleitos, mas nós não podemos ter a pretensão de saber quantos e quais são eles.

Resta-nos, portanto, a alternativa de aceitar que o tema é bíblico, e que não deve ser rejeitado; mas que, também, não deve ser ressaltado para o público em geral, pois entre os seus componentes podem existir pessoas fracas na fé, e outras tantas com dificuldades de compreensão de um tema tão difícil.

Se, numa dada assembléia, o tema tiver que ser pregado, o bom senso diz que é preciso assumir que todos que estão na assembleia são, provavelmente, eleitos, mas que ninguém se orgulhe disse, pois o nome dos eleitos e róprobos é de conhecimento exclusivo de Deus. Que todos se esforcem, pois, para agir segundo a vontade dEle e que, pela fé e pelo amor, se empenhem a executar as obras que procedem da fé e do amor, gerando esperança para todos que se sentem chamados.

Tenhamos em mente Deuteronômio 29:29:

As coisas encobertas pertencem ao SENHOR nosso Deus, porém as reveladas nos pertencem a nós e a nossos filhos para sempre, para que cumpramos todas as palavras desta lei.

Se você quiser a opinião de um calvinista presbiteriano, altamente qualificado, sobre como compreender o paradoxo da soberania de Deus frente à responsabilidade humana, leia o texto Eu Não Sei.


6. BIBLIOGRAFIA
Indicada ao longo da reflexão.

terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

O humanismo cristocêntrico

O indivíduo, ao olhar apenas para si mesmo, vive a ilusão egocêntrica.

Avançando ao extremo do imanentismo, ele se anula e passa a enxergar a unidade na Humanidade, assumindo uma filosofia de vida antropocêntrica.

Entretanto, ao descobrir a verdade sobre si mesmo, o indivíduo passa a viver um humanismo cristocêntrico, este apresentando os seguintes aspectos principais:

1. pode-se atingir a mais alta liberdade tornando-se livre de todos e, ao mesmo tempo, sendo servo de todos;
2. a união com Deus dá-se por meio de Jesus Cristo, mantendo-se contato com a Humanidade, porém superando-a.

O humanismo cristocêntrico é, pois, um humanismo transcendente. Vendo-se como imagem de Deus, o homem ama a Deus acima de tudo, e ao próximo como a si mesmo.

No humanismo cristocêntrico combinam-se: a filosofia especulativa, a ciência dos fundamentos, a tecnologia e a ética.

A política, que trata da organização social, inclui a todos e, sob a perspectiva do humanismo cristocêntrico, deve partir dos pontos comuns a todos os homens.

domingo, 6 de fevereiro de 2011

O Evangelho de Cristo na interseção de todas as doutrinas cristãs válidas

Um brainwriting preliminar em busca de novas sugestões


RESUMO

Nesta reflexão, faço uma tentativa de identificar e explicitar os pilares fundamentais de uma doutrina cristã universal dentro do campo cristão. Não se trata de defender o ecumenismo, mas de encontrar alguns elementos que possam ser válidos numa conversa civilizada entre pessoas que se dizem cristãs e, ao mesmo tempo, racionais. Se assim for, não se deve alimentar dissensões em torno de pontos difíceis, a não ser entre especialistas, e em local reservado. A conclusão desta reflexão é que, no ponto de partida ou no ponto de chegada, só existe um referencial: o Evangelho de Cristo na forma como Ele mesmo o resumiu.


1. INTRODUÇÃO

Para não alimentar nenhum tipo de confusão que possa insinuar-se ao longo deste texto, começo pelo ponto de partida que, ao final, também será a conclusão desta reflexão. A doutrina de Cristo foi sintetizada por Ele mesmo em Marcos 12:30-31:

"Amarás, pois, ao Senhor teu Deus de todo o teu coração, e de toda a tua alma, e de todo o teu entendimento, e de todas as tuas forças; este é o primeiro mandamento.
E o segundo, semelhante a este, é: Amarás o teu próximo como a ti mesmo. Não há outro mandamento maior do que estes."


Esta é a doutrina-raíz. Ela é simples, clara e concisa, mas não é fácil de ser praticada. O caráter do cristão capaz de praticá-la precisa ser formado pela educação cristã, embora o resultado final não possa ser garantido. E isso exige uma espécie de grade curricular, sendo este, conforme acredito, o significado das diversas doutrinas cristãs particulares.

Se o centro de tudo está no amor, como fica a questão genética? O amor é um dom de Deus, entregue na sua forma acabada, ou pode ser aprendido? Falando francamente, minha resposta é: - Não sei. Contudo, a experiência mostra que o homem só ultrapassa o seu nível animal pela educação. Então, acredito ser razoável que o amor também deva fazer parte dessa educação, embora ela não possa garanti-lo. Sob esta perspectiva, todos os desdobramentos da doutrina original de Cristo são uma espécie de grade curricular para ensinar a arte de amar.

Também, não sabemos em que proporção Deus atua diretamente, dentro da pessoa, ou por meio de intermediários. Agostinho lembrou, no seu livro A Doutrina Cristã, que Deus às vezes agiu diretamente, mas parece que Ele quis usar o homem como seu intermediário, como está registrado em muitas passagens bíblicas. Isso ocorreria para o benefício do homem que, assim fazendo, estaria demonstrando dignidade no uso do seu livre-arbítrio para o bem, ao invés de usá-lo para o mal.

Sabemos que a educação é uma necessidade, pois o próprio Cristo submeteu-se a ela, conforme foi dito em Lucas 2:52 "E crescia Jesus em sabedoria, e em estatura, e em graça para com Deus e os homens."

Portanto, ao falar na construção de uma doutrina cristã, é preciso sempre explicitar o ponto de partida, mergulhar na luta que leve à sua realização e, ao final, confrontar-se novamente com este ponto de partida e assumir que ele é, também, o ponto de chegada. Se esse princípio não for aceito, não há sobre o que falar.

A construção de qualquer doutrina - que estou considerando como uma grade curricular para a educação - exige um método. Este será descrito a seguir em suas linhas gerais.


2. O MÉTODO

O método de pesquisa, em todas as áreas do conhecimento, tem uma estrutura geral fixa, embora possa ser expresso de muitas maneiras, e com diversos graus de detalhamento. O método de Einstein, por exemplo, está descrito no seu livro Notas Autobiográficas e no livro A Imaginação Científica, de Gerald Holton.

Einstein acreditava que cientista não é quem usa o método científico, mas quem tem a vocação de cientista. Apesar disso, afirmou que o domínio do método é mais importante do que usar o cérebro como depósito de informação. Esse método será descrito a seguir, em suas linhas gerais, com a devida atenção à sua adaptação para a pesquisa e elaboração de doutrinas e, em especial, as doutrinas cristãs.

Na sua versão mais avançada, o método científico pressupõe que se parta da certeza de que existe algo que não se vê, mas cujos indícios podem ser intuídos, ou percebidos por meios indiretos. Assume-se que é possível conhecer o que se busca e, em proporção à fé, busca-se com menor ou maior intensidade. A fé, por sua vez, é definida pelo Apóstolo Paulo em Hebreus 11:1 da seguinte maneira: "Ora, a fé é o firme fundamento das coisas que se esperam, e a prova das coisas que se não vêem."

No caso de Einstein, ele afirmou que, após intensa busca e, geralmente, em momentos não relacionados com essa busca, a verdade manifesta-se como axioma que traz certeza absoluta ao pesquisador. Entretanto, é necessário extrair as consequências lógicas desse axioma e testá-las por meio de experimentos apropriados. Foi por esse método que ele alega ter chegado à conclusão de que matéria e energia se equivalem segundo certa relação matemática. E isso foi amplamente comprovado na teoria e na prática.

Entretanto, é necessário adaptar o método científico à pesquisa em teologia. Tomás de Aquino, ao usá-lo muito antes de Einstein, partiu da aceitação da Revelação, sem a qual não seria possível conhecer Deus apropriadamente. No caso, ele assumiu que, para o crente, e apenas para o crente, seria possível ascender das coisas criadas e, por analogia, chegar a algum conhecimento do Criador. Isso seria útil para ajustar fé e razão e, assim, fortalecer a certeza já dada pela Revelação. Aquino buscava em todas as fontes que tinham credibilidade, pesava prós e contras, e decidia usando sua razão, mas sempre em conformidade com as verdades já firmadas pela Igreja.

O método, aplicado à elaboração de doutrinas, visa à interpretação e organização das informções existentes. As informações para se elaborar uma doutrina cristã devem ser buscadas, em primeiro lugar, na Bíblia, mas é necessário, ainda, consultar: os praticantes, os sistematizadores e os analistas, cujo significado será explicado mais à frente.

Parte-se de uma busca panorâmica, identificam-se os elementos essenciais a serem pesquisados e, em seguida, fazem-se análises desses elementos. Havendo mais de uma abordagem respeitável sobre o mesmo tema, comparam-se as abordagens e cria-se uma nova versão, que se supõe ser verdadeira.

Contudo, a avaliação final de qualquer doutrina, assim como de uma teoria científica, passa pelo crivo lógico, pela derivação de suas consequências, se verdadeiras, e pela confirmação dessas consequências na prática. Quanto aos que se dizem adeptos da doutrina de Cristo, por exemplo, o critério de avaliação foi dado pelo próprio Cristo:"Portanto, pelos seus frutos os conhecereis. Mateus 7:20"

Ao buscar informações na Bíblia, é preciso levar em consideração que algumas passagens parecem ser obscuras, ou estar em contradição com outras. Isso pode dar margens a erros, na melhor das hipóteses, ou falsificações, na hipótese de ela estar sendo usada com má fé. Os especialistas formuladores de doutrinas, como ocorreu com Agostinho, Lutero e Calvino, precisam estudar hermenêutica e exegese, além de vários outros temas filosóficos e científicos. Mesmo assim, as eventuais doutrinas criadas não têm valor algum se não puderem ser confrontadas com a prática para referendá-las.

Tomados todos os cuidados pertinentes, ainda é preciso levar em consideração que uma eventual doutrina cristã assim elaborada não pode passar de mero desdobramento da doutrina-raíz que nos foi dada por Cristo. Pode ser que uma versão elaborada com todos os cuidados, alguns dos quais foram aqui citados, seja mais compreensível do que as demais existentes, inclusive destacando aspectos anteriormente esquecidos.

A consolidação de um currículo para a educação cristã, ou doutrina cristã, necessita que se façam consultas, além da Bíblia, a outras fontes de pesquisa completamentares. Quanto a isso, ressalte-se a recomendação do Apóstolo Paulo em 1 Tessalonicenses 5:21: Examinai tudo. Retende o bem.

Há ainda que se destacar, no caso da educação quanto a uma doutrina, que a aprendizagem primeiro se dá pelo exemplo. O educando, num primeiro momento, presta atenção e absorve as lições sem questioná-las, principalmente nos seus primeiros anos de vida. Com o tempo, pode rejeitar a mensagem e iniciar buscas próprias, ou pode simplesmente ajustar a mensagem recebida à realidade, de acordo com as suas condições de existência.

No caso da educação cristã, o aprendiz, ao atingir certo nível de sabedoria, torna-se praticante autônomo. Ele deve, então, julgar cada caso particular a que é submetido segundo o princípio geral fixado no seu intelecto e no seu coração pela doutrina. Sendo necessário, ele deverá tomar decisões que, posteriormente, poderá revisar. Assim, ele não mais se torna preso aos detalhes de uma doutrina qualquer, mas à doutrina-raiz que se fixou no seu ser. Em linguagem laica, ele se torna um praticante reflexivo, um verdadeiro pesquisador da verdade na sua vida diária.

A seguir serão dadas explicações sobre o significado das fontes de consulta para a elaboração de doutrinas, aqui chamadas de: praticantes, sistematizadores e analistas.

2.1 - Os Praticantes
No cristianismo, entendo que os praticantes são as pessoas reconhecidas pelo seu comportamento orientado pela doutrina de Cristo, esta centrada no "amor a Deus e ao próximo". É evidente que qualquer julgamento sobre a prática de alguem quanto a essa doutrina é sempre superficial, pois só Deus pode avaliar o que se passa no interior do homem, não importa o quanto o seu discurso e sua prática exterior sejam compatíveis com a doutrina publicamente professada.

A pergunta central, quanto aos praticantes é: existem modelos de cristãos com os quais se possa aprender algo da doutrina de Cristo ao longo dos séculos?

Como o principal documento comum a todos os cristãos é a Bíblia, a menos de alguns livros em que não há consenso entre católicos e protestantes, segue-se que os modelos típicos devem ser buscados nela, em primeiro lugar. Cristo é o cabeça desses modelos. Seus apóstolos são os modelos secundários. Todos os demais personagens são modelos terciários, mas ainda válidos, seja como exemplos do que fazer, seja como exemplos do que não fazer.

Contudo, é preciso que tais modelos sejam encontrados ao longo dos séculos, sob pena de se considerar que a doutrina tenha sido extinta. A Igreja Católica, além dos modelos bíblicos, adota os santos como referência, aos quais dá uma espécie de certificado de garantia de que foram cristãos piedosos e dignos de serem levados em conta como modelos de vida. Os protestantes não recomedam modelos fixos além do próprio Jesus Cristo e dos demais modelos bíblicos. Contudo, eles costumam indicar, sem exclusividade e sem unanimidade, pessoas que consideram gigantes da fé.

2.2 - Os Sistematizadores
Os sistematizadores formulam doutrinas que, por sua vez, podem ou não ser incorporadas pela orgnanização humana chamada igreja. Para sistematizar, eles precisam ser também analistas, mas para que seus sistemas tenham credibilidade, eles precisam ser praticantes respeitáveis. Senão tudo se transformaria em hipocrisia.

Além do próprio Cristo, que deixou uma doutrina devidamente ilustrada com bons exemplos, parece que o único sistematizador de amplo espectro aceito por todos é o Apóstolo Paulo. Contudo, com base em Paulo, e também por outros motivos, tiraram-se conclusões que colocaram protestantes e católicos em oposição, o que dividiu a Igreja de Cristo - a militante - no século XVI.

Depois de Paulo, embora vários outros sistematizadores tenham dado a sua contribuição, o consenso recai, por vários séculos, sobre Agostinho de Hipona, o Santo Agostinho da Igreja Católica. Ele é considerado uma fonte tanto para o catolicismo como para o protestantismo. Mas, igualmente, é citado para defender certas posições que são antagônicas entre si.

Após Agostinho, um novo sistematizador foi adotado como referencial pela Igreja Católica Romana: Tomás de Aquino. Mas, ele não é bem aceito pelos protestantes, embora estes o estudem como sendo representativo da teologia tipicamente católica. Contudo, Aquino absorveu a doutrina-raíz de Cristo, além dos aspectos essenciais das doutrinas registradas pelo Apóstolo Paulo e por Agostinho de Hipona. A predestinação, por exemplo, da qual Calvino é acusado de ser o principal defensor, tem sua defesa racional em Aquino, embora a Igreja Católica não a tenha adotado na forma como ele a sistematizou.

Entre os protestantes, destacam-se Lutero, que deu origem ao seguimento independente denominado luterano, e Calvino, que deu origem ao calvinismo. Ambos reportam-se a Paulo e a Agostinho; porém, como forma de chegar novamente a Cristo. Contudo, eles não conseguiram estabelecer uma doutrina totalmente compartilhada. Seus adeptos seguiram caminhos próprios, embora tenham preservado certas crenças comuns.

2.3 - Os Analistas
Tanto os praticantes como os sistematizdores podem ser também analistas. Entretanto, destaco os analistas em sentido pleno; eles não precisam ser, necessariamente, praticantes ou sistematizadores. Sua ênfase é colocada na análise da consistência lógica interna de uma doutrina, e confrontam as divervas doutrinas entre si para explicitar suas semelhanças e diferenças. Eventualmente eles infuenciam praticantes e sistematizadores mais intelectualizados, e podem até chegar a fazer propostas de sistematização.

2.3.1 - Os analistas lógicos
Eles analisam, ou deveriam analisar as doutrinas sem pressupostos. Sua intervenção deveria ater-se a encontrar contradições na lógica adotada e apresentá-las de forma clara. Na atualidade eles se comportam como analistas do discurso, e estão atentos para o choque entre a prédica e a prática. Geralmente eles desconfiam de intenções ocultas, estas de natureza ideológica, visando a conquistar, às vezes subliminarmente, corações e mentes para uma visão de mundo. Acredita-se que raramente alguém possa atuar com tamanha isenção, pois, quer explicitem ou não, toda pessoa julga a realidade a partir de uma visão de mundo.

2.3.2 - Os analistas ateus ativistas
Eles partem do principio de que não há Deus. A partir dai tentam demolir todos os argumentos contrários aos seus. É como se eles fossem crentes no ateísmo e, por isso, não têm credibilidade junto aos crentes, nem junto aos analistas que se pretendem cientistas objetivos, aqui chamados de analistas lógicos. Contudo, no que se refere ao levantamento de possíveis contradições nos textos que analisam, eles devem ser levados em consideração, pois dedicam-se com afinco a essa tarefa.

2.3.3 - Os analistas crentes
Eles partem de princípios gerais aceitos por todos os crentes, ou pelos crentes do seu seguimento cristão, e questionam apenas os desdobramentos e argumentos secundários que não vão contra a fé estabelecida. Eles têm a vantagem de, como crentes assumidos, não necessitarem dar explicações aos ateus. Quando se confrontam com eles, procuram fazê-lo apenas no nível da lógica, e não da afirmação da própria crença pela persuasão.

2.3.4 - Os analistas "crentes agnósticos"
Eles se dizem crentes, mas têm dúvidas. Por isso propõem-se a fazer análises usando o método científico pretensamente neutro. Neste caso, eles podem chocar-se contra verdades aceitas, e questioná-las. Mesmo quando se mantêm fieis a certas crenças comuns, costumam ser rejeitados pelos crentes que se dizem ortodoxos.


3. ALGUNS ELEMENTOS COMUNS A TODAS AS DOUTRINAS VÁLIDAS

Levando em consideração o método anteriormente explicado, fiz leituras críticas que me levaram a identificar os pilares fundamentais das doutrinas cristãs, na forma como os julguei úteis à educação.

Tomei como referências: Jesus Cristo, o Apóstolo Paulo, Agostinho de Hipona, Tomás de Aquino, Lutero e Calvino. A partir das minhas leituras, conclui que os resultados a que cheguei poderiam ser aceitos por todos eles, e que os pilares encontrados estão presentes, de forma explícita ou implícita, nos documentos católicos e protestantes.

Contudo, faço este exercício apenas como um reflexão, e recomendo que, à medida do possível, o leigo que deseja usar sua razão, faça suas próprias reflexões e tire suas próprias conclusões.

3.1 - Deus
Deus é aceito por todo o campo cristão como sendo triuno. Todos O consideram como a fonte invisível de toda realidade visível, e praticamente não há discordâncias sobre Ele, exceto quanto à aparente contradição entre Sua onipotência e o livre-arbítrio humano. O Deus Filho, encarnado como Jesus Cristo, fez a conexão entre o homem e Deus, mostrando o caminho da salvação para além deste mundo.

Nesta reflexão, Deus não foi objeto de especulação. Assumi que, quanto a tudo que não esteja ao alcance da razão humana - pelo menos da minha razão - a Seu respeito, deve-se calar. Insistir em debater, para público não especializado, o que foi considerado incompreensível pelos grandes filósos cristãos, é inútil e perigoso, pois pode deseducar e gerar dúvidas.

3.2 - O Amor
O amor deve referir-se a Deus e ao próximo. Sua prática pressupõe fé, e gera esperança. A expressão sintética mais autoritativa a esse respeito foi feita por Jesus na síntese que Ele fez da Lei e dos Profetas. Ela é reforçada maravilhosamente pelo Apóstolo Paulo em 1 Coríntios 13.

Entretanto, o amor - a Deus e ao próximo - só se concretiza na vida prática. Esta, por sua vez, demanda educação. Daí que as doutrinas particulares devam apresentar-se como uma espécie de grade curricular de educação para a vida, conforme veremos.

Certas questões difíceis não precisam ser abordadas nesta reflexão, pois tornam-se irrelevantes para o praticante. Por exemplo, a questão do conflito entre fé e obras. A fé, em sentido pleno, gera as obras da fé. Por outro lado, obras, feitas como tais, não salvam. Entretanto, o mundo precisa de obras, sejam elas obras de salvação, ou obras realizadas para o bem estar neste mundo.

Igualmente, não é relevante, para esta reflexão, a questão da eleição e da predestinação. Se alguém é eleito e predestinado, ele precisa de educação. Como não se pode saber, antecipamente, nada a esse respeito, há que se submeter todos à melhor educação possível, de acordo com a capacidade que cada um demonstra. Feito o melhor possível, de acordo com a melhor tecnologia educacional existente, os resultados devem ser deixados para que Deus os conduza.

Temas como a quantidade e qualidade dos sacramentos, entre outros, também não são relevantes para esta reflexão. Cada doutrina se mantém de pé ou cai na proporção em que use sua liberdade de consciência para escolher o que é certo ou errado quanto ao que vai além daquilo que foi recomendado diretamente por Jesus Cristo. Ninguém é obrigado a concordar com esses aspectos particulares, nem pode impor aos demais seguimentos sua forma de interpretá-los, pois a liberdade de consciência, enquanto for da vontade de Deus, é uma conquista definitiva das sociedades abertas.

Assim, na vida prática, serão focados, nesta reflexão, apenas elementos comuns passíveis de aceitação por todos os seguimentos cristãos e, eventualmente, pela educação laica. Pelo menos essa é a intenção.

3.3 - A Vida Prática
Deus, para o educando, deve ser apresentado como a fonte do amor, inclusive aquele que lhe é dedicado. O amor não apenas deve ser aplicado ao aprendiz, como também deve orientar a prática do relacionamento dos seus pais, familiares e, se possível, professores em geral. O recém-nascido, como o peixe, deve nascer mergulhado na vida cristã prática.

Sob a perspectiva laica, o amor deve, no mínimo, ser substituído por respeito e solidariedade. Isso implica que a educação laica fornecida pelo Estado deve ser cobrada como a melhor síntese do avanço da civilização. A educação cristã não pode estar aquém dessa educação laica universal, embora deva superá-la em muito. E isso é muito difícil, embora não seja impossível.

Na vida prática, os rituais têm um importante papel para fixar o caráter por meio de hábitos, valores e disposições para a ação. Estes, por sua vez, devem se fixados em ambientes que combinem emoção sadia com o desenvolvimeto de um senso crítico que permita separar a verdade da falsidade e do erro. O medo deve ser evitado, pois ele pode gerar o fariseu covarde. Enfim, a fé, o amor e a esperança, devem conduzir a vida.

Os principais elementos para um currículo de educação cristã, conforme consegui distingui-los, ainda que provisoriamente, serão destacados a seguir.

3.3.1 - Formação da Identidade
A identidade do cristão, embora possa ser expressa de várias maneiras, já está bem definida a priori. Ela compreende sua missão, sua visão de futuro e seus valores.

Missão
Amar a Deus e ao próximo. Isso implica servir.

Visão de Futuro
União com Deus. Isso implica buscar essa união desde já, mas sabendo que ela se concretizará apenas na outra vida.

Valores
Podem ser expressos de muitas maneiras, mas algumas palavras são importantes para fixá-los; por exemplo: justiça, bondade e humildade.

Essa identidade poderá ser fixada paulatinamente por meio de diálogos, leituras e apresentação de casos na forma de histórias agradáveis, além de jogos que simulem situações cuja identidade é posta à prova.

3.3.2 - Fixação dos Bons Hábitos
Cada novo ser humano chega ao mundo e herda a cultura estabelecida. Para que ele não tenha que viver toda a história da Humanidade, os hábitos filtrados por sua comunidade lhe são transmitidos. No caso do cristianismo, esses hábitos são aqueles julgados como válidos e necessários para vivenciá-lo.

Os principais hábitos a serem fixados na infância poderiam ser, entre outros: orar o Pai Nosso, agradecer a Deus pelas refeições, dizer muito obrigado e por favor, visitar os doentes nos hospitais, ajudar a quem precisa. Logicamente, os hábitos devem ser escolhidos para dar suporte á vida como um todo, e não apenas quanto ao comportamento estritamente cristão. O núcleo sadio da educação laica é plenamente compatível com a educação cristã, como é o caso dos pilares propostos pela UNESCO: aprender a ser, aprender a conviver, aprender a fazer e aprender a aprender.

Tendo em vista a questão da sustentabilidade, por exemplo, é preciso que se criem hábitos relativos ao bom uso dos recursos disponíveis, visando a garantir uma vida de qualidade para as gerações futuras. Contudo, os hábitos que garantem uma vida coletiva satisfatória, em sentido laico, não têm relação com a salvação da alma.

3.3.3 - Desenvolvimento do Senso Crítico
Hábitos são herdados, mas nem sempre há garantia de que sejam os mais apropriados. Pode ser que não houvesse conhecimento suficente quando eles foram fixados. Então, o mais importante é o desenvolvimento de um senso critico capaz de avaliá-los, assim como se deve avaliar cada situação particular da vida. Em verdade, trata-se de consolidar o bom senso, a partir do domínio da dinâmica do conhecimento humano.

O senso de divindade, o senso mais importante para o cristão, faz parte de sua estrutura íntima, devendo ser apenas ativado, inicialmente a partir do hábito de participar das atividades da religião racionalmente administrada. O robustecimento desse senso depende de estudo, reflexão, e prática, tanto individual como coletivamente.

3.3.4 - Filiação a uma Denominção Séria
O processo educativo, para ser transmitido de geração em geração, exige uma instituição para tal. Assim, as denominações cristãs justificam-se como guardiãs da doutrina de Cristo, esta desdobrada na grade curricular típica da denominação considerada. Essa grade curricular, ou doutrina, por sua vez, deve ser submetida ao senso crítico de vez em quando, pois ela pode fixar elementos humanos nascidos do orgulho e da ignorância dos seus formuladores.

A perspectiva crítica aqui defendida esteve no cerne da Reforma Protestante do século XVI. Ela consolidou-se, principalmente, no presbiterianismo, cujas características serão sumariamente apresentadas a seguir, conforme pude compreendê-las.


4. PRESBITERIANISMO: Um Caso Particular de Expressão do Evangelho de Cristo

4.1 - O Presbiterianismo
O presbiterianismo equivale à forma como John Knox intrepretou a Reforma Protestante do Século XVI, e a implementou na Escócia. O contexto era de confronto com a Igreja Católica Apostólica Romana. Sua principal característica é a democracia representativa, por meio de administração colegiada de toda a comunidade, como é feito hoje nas melhores Universidades Federais brasileiras.

John Knox foi obrigado a aceitar a luta, discursiva e física, visando à liberdade de culto a Deus segundo sua compreensão do que fosse a doutrina de Cristo na sua forma mais pura, esta interpretada, à época, por João Calvino. Knox venceu a luta. A partir da Escócia, e de outros países europeus, o presbiterianismo migrou para os Estados Unidos e, de lá, para o Brasil. Meu contato com ele deu-se por nascimento numa comunidade ligada à IPB - Igreja Presbiteriana do Brasil, da qual destaco os seguintes aspectos essenciais.

4.1.1 - A doutrina da IPB tem como ponto de partida o Evangelho de Cristo conforme apresentado pelo próprio Jesus Cristo em Mateus, Marcos, Lucas e João. Este Evangelho, por sua vez, está anunciado na Bíblia, de Gênesis a Apocalipse.

4.1.2 - A Bíblia é o documento máximo de onde são retirados todos os demais documentos, inclusive a Confissão de Fé de Westminster, assumida como sendo a melhor exposição da sua doutrina.

4.1.3 - A IPB considera que todo documento redigido por homens, ainda que eles usem a Bíblia como fonte, estão sujeitos a falhas humanas. Com isso, abre-se a possibilidade de que todos eles sejam analisados criticamente, sempre tendo como referência a própria Bíblia.

4.1.4 - A IPB adota alguns pontos de vista que, apesar de serem bíblicos, ou dela derivados pela análise lógica, não são compartilhados por outros seguimentos cristãos. Um exemplo típico é o batismo por aspersão, este compartilhado com a Igreja Católica Romana, porém rejeitado pela maioria dos demais seguimentos. Entretanto, a IPB julga que esses pontos de conflito não fazem parte do núcleo pétreo da doutrina de Cristo.

4.2 - Conclusão sobre a Doutrina Presbiteriana
Conforme pude compreender, a doutrina presbiteriana tem no seu núcleo pétreo a própria doutrina de Cristo. Ela reconhece que a forma particular com que expressa essa doutrina, para efeito de educação, pode ser continuamente analisada e melhorada. Ela está consciente de que a prática diária deve ser conduzida segundo os aspectos firmemente estabelecidos, não aceitando sua livre mudança por líderes de comunidades. Toda eventual mudança deve ser pensada e analisada com base no pensamento racional das pessoas que foram devidamente preparadas para enfrentar esse desafio, isso de forma institucional. A IPB não faz diferenciação entre doutos e indoutos, sob a perspectiva humana, mas entre piedosos e não piedosos, segundo a prescrição do Evangelho de Cristo na sua forma mais pura.


5. CONCLUSÃO GERAL

Conforme foi dito já na introdução desta reflexão, a mais autorizada versão da doutrina de Cristo foi dada por Ele mesmo. Ela não é uma questão teórica, mas, essencialmente, prática. Contudo, cada seguimento cristão vê-se na necessidade de formular sua grade curricular, ou doutrina, para educar os seus membros. Nesse processo podem perder-se em discussões de aspectos secundários e, assim, descuidarem da prática da doutrina-raiz.

Quanto a Deus, só se chega a Ele pelo amor, este proveniente da fé. O amor é o elemento central, no qual tudo se dilui, inclusive a fé. Fé e amor geram esperança. Esta deve ser alimentada na vida prática por meio de mecanismos de apoio, entre os quais os diversos ingredientes da sã doutrina, como os sacramentos corretos. Porém, os diversos seguimentos cristãos não são unânimes em todos os detalhes de suas doutrinas, embora compartilhem do núcleo central da doutrina de Cristo.

Embora lamentável, essa divisão é inevitável enquanto não houver amadurecimento no amor e no uso da razão. O Apostolo Paulo enxergou isso em sua época e, embora defendesse a unidade em torno do núcleo pétreo, capaz de unir todos os cristãos, suportou a idéia de que os partidos - no caso denominações -, se se comportarem dentro de certos limites, devem ser tolerados. Paulo chegou a fazer referência aos fracos na fé, os quais, na sua opinião, não deveriam ser desafiados, nem constrangidos.

Assim, o núcleo pétreo do Evangelho de Cristo é sempre e eternamente o mesmo.

Defendo que é necessário ter em mente esse ponto de partida unificador, evitar a discussão pública dos aspectos que trazem divergências, promover discussões entre especialistas para se chegar ao consenso e, sobretudo, enfatizar a prática daqueles aspectos que, embora óbvios, são esquecidos exatamente pelo fato de serem óbvios.

O óbvio que precisa ser posto em prática foi apresentado por Ele em Marcos 12:30-31:

"Amarás, pois, ao Senhor teu Deus de todo o teu coração, e de toda a tua alma, e de todo o teu entendimento, e de todas as tuas forças; este é o primeiro mandamento. E o segundo, semelhante a este, é: Amarás o teu próximo como a ti mesmo. Não há outro mandamento maior do que estes."

Esta reflexão chega ao final, conforme prometido desde o início, enfatizando o seu ponto de partida. O Evangelho de Cristo, resumido por ele mesmo, deve orientar qualquer diálogo bem intencionado. Ele deveria ser suficiente, quando citado, para calar quaisquer dissensões e envolver a todos, imediatamente, na sua prática.